quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Lusitânia Expresso #09: peixe:avião "A Espera é um Arame"

Enquanto se esperam mais umas semanas para o aguardado lançamento do álbum "40.02" dos bracarenses peixe:avião, um dos mais promissores projectos da nova música portuguesa - que até tiverem a honra de ter um texto de apresentação escrito por Adolfo Luxúria Canibal - já podemos ouvir e ver o videoclip do tema de apresentação "A Espera é um Arame".
Aqueles com memória mais curta serão tentados a ouvir em peixe : avião ecos de Radiohead e eles estão lá, efectivamente, mas enquanto herança de uma linhagem muito mais antiga, com genealogia nos pergaminhos de Canterbury e no rock progressivo dos primeiros Pink Floyd de Syd Barrett e dos Van Der Graaf Generator de Peter Hammill, passando pelo krautrock dos Faust ou dos Neu!. Mas se a estirpe é identificável, o que faz a singularidade de peixe : avião é a portugalidade que irradia, como se de repente tudo o que nos habituamos a associar à alma portuguesa, a melancolia dos seus poetas, o singelo das pequenas coisas, se cristalizasse em sons e palavras. Esqueçam o fado como Amália o popularizou e é macaqueado de Portugal ao Japão: o novo fado do século XXI é peixe : avião!

Nada disto faz sentido, decerto, numa lógica estritamente científica ou numa abordagem puramente musicológica e, no entanto… faz todo o sentido!!! peixe : avião é um milagre! É um milagre na sua génese, na maneira como cinco desconhecidos, que mal se conhecem ou desconhecem de todo, vindos de diferentes áreas e diferentes bandas, de imediato se completam e dão corpo, numa espécie de geração espontânea, a uma obra única, de marcada identidade e sensibilidade; e é um milagre a música em si, o modo como a tristeza, o tédio, o abatimento, a espera, o cândido são adornados com a banda sonora perfeita e absoluta e cantados pela notável e estranha poesia de Ronaldo Fonseca, numa união imaculada e magnífica. Como se peixe : avião sempre tivesse existido algures no limbo da nossa inconsciência, na maresia das tardes de Verão, na aragem trazida pelas primeiras chuvas, e esperasse a junção dos vocábulos para tomar forma. Nesse sentido, nunca um nome espelhou tão perfeitamente o objecto que designa. Porque nunca a dissemelhança foi tão harmoniosamente enlaçada na criação do novo como acontece com peixe : avião.

Há muito – demasiado – tempo que não somos surpreendidos por uma obra musical. Nada de espantar, porquanto os milagres e o sublime só acontecem muito raramente… Mas quando temos o privilégio de viver um momento desses, como é o caso com a audição de “40 : 02” de peixe : avião, só podemos regozijar-nos e espalhar a boa nova pelos quatro cantos da terra. É o que eu faço e o convido a fazer: entre no mundo maravilhoso de peixe : avião, deixe-se mergulhar nas correntes aéreas deste oceano desconhecido, desfrute da viagem pelas profundezas da brisa outonal e vai ver que também vai sentir esta alegria, esta fé resplandecente na capacidade humana para produzir o belo que só as grandes obras conseguem gerar.

Texto de Adolfo Luxúria Canibal

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1 comentário:

Anónimo disse...

pelo q ouvi, parece-me bem!