No âmbito do evento Make Up Your Mind'08, que hoje vai decorrer na zona histórica de Coimbra e que já aqui abordei há dias, aqui fica a entreveista com um dos intervenientes: M-Pex, projecto pessoal e ousado do músico Marco Miranda, cujo disco de estreia "Phado " já teve honras de disco da semana por estas bandas. A ilustrar um video de uma actuação no Centro de Congressos de Lisboa:
BrainDance: A forma como o fado em geral, e a guitarra portuguesa em particular, se cruzaram na tua vida está extremamente bem retratada nas diversas entrevistas e artigos que disponibilizas no blog do teu MySpace, por isso, sem colocar de lado essa parte, vamos começar por falar sobre a outra: a vertente electrónica.
Quando e como te começaste a interessar pela música electrónica?
M-PeX: O despertar e interesse pela música electrónica surge marcadamente em 1999 quando visitei um amigo (e vizinho) - José Reis - que era (e é!) amante e produtor de música electrónica. Deu-me a conhecer a música que produzia, bem como a sonoridade de muitos e muitos projectos de música electrónica. Fiquei maravilhado com as possibilidades daquele novo universo, onde tudo era possível e permitido. Mostrou-me como produzia música apenas com um computador, mesa de mistura, microfone e uma guitarra clássica. Fiquei fascinado e pedi-lhe para disponibilizar-me algum software de produção áudio, samples e bancos de som MIDI. Comecei logo a fazer umas “brincadeiras sonoras”. José Reis, crítico e perfeccionista, ouvia as minhas produções embrionárias e ajudou-me a evoluir, a explorar vários estilos de música, cultivando a experimentação sonora. Posso afirmar que comecei a ouvir música electrónica ao mesmo tempo que comecei a produzi-la, se bem que na altura não passavam de pequenas brincadeiras, sem nunca pensar que iria gravar um álbum (falo do meu disco de estreia "Phado").
B: Dentro da música electrónica quais foram os projectos que mais te marcaram e porquê?
M: Os projectos de música electrónica que mais me marcaram foram entre muitos, Amon Tobin, Aphex Twin, Squarepusher, Sofa Surfers, Massive Attack, Goldie, LTJ Bukem, Bad Company, u-Zik e Unkle. Marcaram-me essencialmente pela originalidade, pela composição assumidamente electrónica: as batidas quebradas do drum'n'bass, as electrónicas dançantes, os ritmos hip-hop e trip-hop, os baixos do dub e as atmosferas da música ambiental/experimental, foram características e estilos que me cativaram de imediato.
B: Segundo sei manténs um programa de rádio na Rádio Zero, dedicado ao drum’n’bass, é o teu género de eleição? Se sim porquê?
M: Sim, tenho um programa de rádio na Rádio Zero (www. radiozero. pt) do Instituto Superior Técnico (IST) todas as 6f (de 5f p/ 6f), dedicado à música electrónica e drum'n'bass. E sim, o drum'n'bass é o meu género de eleição, se bem que penso estar a passar por uma fase de transição (ou talvez seja apenas uma fase), pois tenho ultimamente apreciado bastante dubstep e techno minimal. Existem muitos projectos interessantes que produzem estes géneros musicais e conseguem criar ambientes, na minha opinião, pouco usuais.
B: Fora do d’n’b o que ouves?
M: Ouço muita música electrónica que me é dada a conhecer, ou através da internet ou por amigos, ou por pesquisa directa em lojas. Projectos muito interessantes, outros que não me cativam muito. Tenho apreciado bastante Broadcast, Monolake, Murcof, Autechre, Burial, Skream, Quantec, entre muitos outros projectos.
B: No teu myspace referes alguns nomes da área da electrónica mais experimental ou IDM, nomeadamente Aphex Twin e squarepusher como influências, é um género que ainda acompanhas? Se sim que nomes destacas no panorama actual?
M: Sinceramente, não tenho acompanhado os dois projectos, nem estou tão pouco actualizado relativamente ao próprio género IDM...Tenho vários álbuns antigos destes dois projectos, mas reconheço que poderia estar mais a par das suas últimas produções e discos.
B: Descreve o teu caminho desde um simples apreciador de música electrónica, até à fase em que começas a manipular sons e a produzir, usando como instrumento um laptop.
M: Como referi anteriormente, comecei a apreciar música electrónica ao mesmo tempo que comecei a produzi-la. Penso que este facto foi bastante decisivo e muito positivo para mim, como experiência contínua e de aprendizagem. Quantos mais projectos ouvia, mais conhecia géneros de música conhecia, e por outro lado, mais e mais ideias me surgiam, naturalmente. Tornava-se quase como que uma necessidade - ouvir para entender o modo como determinada música era construída e ouvir para captar as principais características de cada género de música. Estas ideias eram logo expressas e exploradas no computador. Manipulava e produzia sons usando apenas um laptop, sem mesa de mistura, sem microfones e usando a própria placa de som interna do laptop. Às vezes o mais importante não é o equipamento disponível (sintetizadores, teclados, controladores MIDI, bons monitores, boa placa de som, etc, etc…) mas sim ter as ideias e simplesmente registá-las.
B: Que software usas para a produção e qual o processo que segues na composição de um tema?
M: Uso o Fruity Loops, Wavelab e um arsenal de plug-ins que me ajudam com os efeitos e que constituem verdadeiras ferramentas de edição áudio. 80% das vezes começo pela base - o ritmo e os os baixos - depois adiciono sons - pads, samples, sintetizadores virtuais. A nível de composição e produção não gosto de seguir regras e métodos, a meu ver, limitativos à livre e espontânea criação artística. Claro que existe sempre uma limitação adjacente ao próprio software de produção, ao seu "nº de graus de liberdade", às suas potencialidades, e ainda mais importante que tudo, os conhecimentos do utilizador para usar o software de forma descontraída, rápida e eficaz, como ferramenta de trabalho e produção. Continuando com o meu processo de composição: seguidamente crio uma melodia ou algumas frases na guitarra portuguesa que, na minha perspectiva, encaixam no "background" electrónico. Depois há todo um processo de gravação, selecção das mais bem tocadas frases melódicas e colocação destas no tempo correcto da música. Neste contexto, por vezes a guitarra torna-se mais um som - um ou vários samples de uma melodia, ainda que tocada de propósito para determinado "background" - mas este processo não é regra para que o equílibrio entre as duas sonoridades, da guitarra e da electrónica, funcione bem. Em contraste, 20% das vezes a ideia surge na guitarra portuguesa e a composiçao electrónica desenvolve a partir daí. É curioso que neste caso em que se começa por criar a melodia da guitarra e depois cria-se o "background" electrónico, a probabilidade de existir um maior equílibrio entre as duas sonoridades é maior (se bem que a guitarra tem de ser tocada e gravada ouvindo um metrónomo, caso contrário, é quase impossível criar uma base rítmica que se encaixe). Numa fase mais avançada, faço a sequência com todos os sons por mim criados/alterados/"samplados". E, por último, (pré) masterizo a produção com o Wavelab. Assim nasceu o disco "Phado", por mão própria, em edição de autor, depois de várias recusas de editoras (embora não possa deixar de mencionar os apoios incondicionais da editora sem fins lucrativos Thisco e da Fonoteca Municipal de Lisboa/Câmara Municipal de Lisboa), mas isso é outra história...
B: M-PeX é quase sempre referido como um projecto do músico Marco Miranda. Pergunto: é um dos projectos ou é o projecto? Se é um dos projectos, quais são os outros?
M: M-PeX é o meu projecto a solo, de Marco Miranda. Sou totalmente responsável pelas programações da electrónica e composição, gravação e edição de guitarras portuguesas e guitarras clássicas. Mas tenho outros projectos conjuntos: Double MP (com Marco Ramos, com participações especiais de Tiago Flores (Corvos) e Freddy Locks, em www. myspace. com/doublempband, que prepara o lançamento do disco de estreia “ICTUS” em ínicios de Outubro), McGEA Project (projecto de música electrónica gerada por algoritmos genéticos, com o meu Prof. orientador de tese de mestrado Agostinho Rosa, em www. myspace. com/mcgeaproject, e que já conta com um tema editado digitalmente numa compilação da editora Enough Records) e ainda sou baixista convidado do projecto Hidden ID (www. myspace. com/hiddenidproject), que já conta com EP editado pela Kaos Records/Free Recordings e também prepara o seu álbum de estreia). Também já fui baterista (e vocalista!...) duma banda de metal chamada Silk (com Jorge Rocha na guitarra eléctrica e André Marreiros no baixo eléctrico) e ainda fui baterista numa banda de rock alternativo, chamada "Murmúrio Monótono da Máquina" (com André Coelho no contra-baixo, Pedro Galvão e Miguel Melo nas guitarras eléctricas). Já são alguns projectos…e de vez em quando é complicado conciliar tudo, mas com força de vontade, motivação e muito “amor à camisola” tudo é possível e o tempo é gerido da melhor forma.
B: “Phado” é de facto um disco fantástico! Para mim foi ‘amor à primeira audição’ e o meu exemplar adquirido na FNAC espera ansiosamente por um autógrafo do autor. A ideia de misturar a tradição da guitarra portuguesa com a inovação da electrónica ambiental e experimental é bastante arrojada, como surgiu?
M: É preciso voltar um pouco atrás no tempo para entender todo o processo: o meu avô Luís Tomás Pinheiro, marceneiro de profissão (presentemente reformado) e guitarrista de guitarra portuguesa (ainda dá lições de guitarra!), sempre tocou aos fins-de-semana em casas de fados e festas. Quase todos os fins-de-semana tinha um espectáculo. Por outro lado, alguns dias da semana dava no final do dia lições de guitarra portuguesa em sua casa. No fundo, posso afirmar que cresci a ouvir fado, ouvi diariamente o trinar, o gemer da guitarra portuguesa tocada pelo meu avô. Quando o meu avô se apercebeu do meu gosto pela música, fez-me uma guitarra clássica, moldando ele próprio a madeira. Aprendi os primeiros acordes e comecei a ajudar o meu avô a ensaiar, em casa, antes das suas actuações. O meu avô à guitarra portuguesa e eu a acompanhar à viola (guitarra clássica). Aos 15 anos, o meu avô ofereceu-me a primeira guitarra clássica a sério. Nunca tive aulas de música, à excepção do que aprendi com o meu avô. Penso que o facto de ter crescido a ouvir música, apurou-me um pouco ouvido, pois o que ouvia, conseguia reproduzir. E portanto, foi uma ajuda decisiva para aprender e evoluir sozinho. Um dia, o meu avô desafiou-me para tocar com ele numa casa de fados. Aceitei o desafio e actuámos juntos. Correu bem e continuámos a tocar juntos durante cerca de três anos, até o meu avô "reformar-se" da vida artística. Depois disso, esporadicamente, ligavam-me para tocar com outros guitarristas que não o meu avô. Fui muitas vezes tocar a casas de fados com músicos e fadistas que conhecia na mesma noite do espectáculo (é o chamado “fado vadio”). Num aniversário meu, o meu avô decidiu oferecer-me uma guitarra portuguesa. Fiquei fescinado com o novo instrumento e pedi-lhe logo para começar a ensinar-me alguma da sua escola e métodos. Tratava-se dum instrumento de cordas muito diferente da conhecida guitarra clássica. Dos tempos do "fado vadio", lembro-me bem das críticas que ouvia aos fadistas e dos projectos que tentavam "coisas novas", abordagens diferentes do fado, com instrumentos não tradicionais, e na altura, questionava-me o porquê daquelas críticas. É então que surge a descoberta da música electrónica, como referi anteriormente. Nos dois anos seguintes, explorei a música electrónica. Um dia gravei o meu avô a tocar e brinquei com o que consegui gravar no computador. Achei curioso e gostei do resultado, fui trabalhando o processo, até chegar a este Phado. É assim objectivo de M-PeX reposicionar a guitarra portuguesa no panorama musical, mostrar que não tem de estar só agarrada ao fado, que se pode agarrar a ritmos mais modernos, aconchegando-se, conseguindo respirar e soltar-se, mas sem nunca perder a sua dimensão, em sentido próprio, familiar, íntimo e nobre. É o criar duma ponte entre o ontem e hoje, quebrar barreiras e clichés.
B: Não sendo propriamente um sucesso de massas, nem tendo pretensões a tal, penso eu, o teu disco de estreia quanto M-PeX tem vindo paulatinamente a ganhar a notoriedade e a ter um merecido reconhecimento. Qual a tua visão pessoal do percurso deste disco desde a sua edição até hoje?
M: Para minha surpresa, o meu disco de estreia recebeu e tem recebido um feedback muito positivo, críticas e referências muito gratificantes para mim. Sentir e saber que as pessoas apreciam o meu trabalho e o meu projecto é de facto, a meu ver, o melhor e o mais importante que um músico pode receber. Comecei a produzir umas brincadeiras apenas com um computador, sem qualquer equipamento adicional, numa fase posterior adicionei guitarra portuguesa, os temas começaram a ganhar corpo e maturidade até culminar na edição dum disco, deste "Phado". Com a ajuda da associação cultural sem fins lucrativos Thisco (www. thisco. net) e Fonoteca Municipal de Lisboa/Câmara Municipal de Lisboa, consegui editar este disco em formato CD, em edição de autor (ou seja, o investimento foi suportado por mim, fábrica e custos de pedido de licenciamento na Sociedade Portuguesa de Autores) e através da distribuidora Whitezone consegui que o disco chegasse às lojas FNAC por todo o país. Tenho aprendido muito, tive de estabelecer diversos contactos para que a edição do disco se concretizasse. Contei com a ajuda de muitos amigos a quem agradeço e ficarei eternamente grato: a masterização ficou a cargo de José Reis, o design da capa do disco é de Marco Madruga (www. mozostudio. com) e fotografia de Gonçalo Figueiredo. Fiz uma mini tournée pelas FNAC's do país e foi uma experiência excelente, inesquecível. Do Algarve ao Porto promovi o disco, tratando do booking, rider's técnicos, necessidades a nível de som, horários, etc, etc...Tem sido uma autêntica formação contínua este percurso desde a edição do disco até hoje!
B: O que mudou na tua vida durante este tempo?
M: Muita coisa mudou na minha vida. Para começar, recebo imensos emails por semana, algumas propostas para concertos, encomendas de discos "Phado", alguns emails com feedback positivo, entre muitos outros assuntos, como entrevistas para blogs. Depois é necessário gerir bem a “carreira artística”, actualizar regularmente o site (no meu caso MySpace), responder aos imensos emails que recebo no MySpace, aceitar os convites de amizade que recebo de outros projectos de música, alguns nacionais outros não. Depois é necessário promover e divulgar eventos, críticas, entrevistas e novidades acerca de M-PeX em geral, duma forma regular junto da lista de contactos (que também está continuamente a ser actualizada) através duma newsletter. Por outro lado, os concertos têm sido bastantes, mais do que eu poderia estar à espera. É muito bom tocar ao vivo e mostrar o nosso trabalho ao público. Hoje em dia tenho de gerir muito bem o meu tempo, estabelecer prioridades. Caso contrário, seria impossivel trabalhar, estudar (estou a acabar a minha tese de mestrado em Engª Física, no IST), gerir uma “carreira artística” (não gosto muito deste nome!...) e ainda ter tempo para a família e amigos.
B: Que planos para o futuro? Já tens alguma coisa pensada para suceder a este “Phado” ou ainda estás em fase de o deixar respirar para te inspirares?
M: As minhas produções prosseguem e neste momento, se quisesse, já podia editar outro disco, pois já tenho temas suficientes (alguns poderiam estar incluídos no disco “Phado”, mas ficaram excluídos por minha escolha própria). Mas prefiro que "Phado" respire um pouco mais...acho que ainda é cedo para avançar com novo disco. Mas posso avançar em primeira mão que no próximo disco vão existir temas ambiente, passando pelo dubstep, electro, techno minimal e drum'n'bass, com guitarra portuguesa. Vai ser bastante diversificado. E talvez exista um tema ou outro cantado...a ver vamos. Por outro lado, tenho alguns temas de drum'n'bass (mas sem guitarra portuguesa...) que talvez breve edite em formato digital, a ver vamos também...De qualquer forma, poderão sempre visitar-me em www. myspace. com/mpex e saber as novidades de M-PeX, e quem quiser receber a minha newsletter por e-mail, basta enviar-me e-mail para mpex.phado@gmail.com a solicitá-la.
B: Hoje à noite vais estar a tocar em Coimbra, ao ar livre num local cheio de história e memória onde outras guitarras portuguesas já fizeram muitas serenatas e cantaram muitas estórias. O que esperas desta actuação?
M: Espero que seja uma noite mágica, memorável e que o evento seja um sucesso, com muita afluência de público, e que este seja agradado pelas sonoridades de M-PeX e de restantes bandas/projectos. Espero poder proporcionar um bom espectáculo, num evento com muita animação, boa disposição e vibrações positivas. E mais uma vez obrigado pelo convite e oportunidade em participar no evento "Make Up Your Mind 2008", e por esta entrevista simpática! Obrigado!
BrainDance: A forma como o fado em geral, e a guitarra portuguesa em particular, se cruzaram na tua vida está extremamente bem retratada nas diversas entrevistas e artigos que disponibilizas no blog do teu MySpace, por isso, sem colocar de lado essa parte, vamos começar por falar sobre a outra: a vertente electrónica.
Quando e como te começaste a interessar pela música electrónica?
M-PeX: O despertar e interesse pela música electrónica surge marcadamente em 1999 quando visitei um amigo (e vizinho) - José Reis - que era (e é!) amante e produtor de música electrónica. Deu-me a conhecer a música que produzia, bem como a sonoridade de muitos e muitos projectos de música electrónica. Fiquei maravilhado com as possibilidades daquele novo universo, onde tudo era possível e permitido. Mostrou-me como produzia música apenas com um computador, mesa de mistura, microfone e uma guitarra clássica. Fiquei fascinado e pedi-lhe para disponibilizar-me algum software de produção áudio, samples e bancos de som MIDI. Comecei logo a fazer umas “brincadeiras sonoras”. José Reis, crítico e perfeccionista, ouvia as minhas produções embrionárias e ajudou-me a evoluir, a explorar vários estilos de música, cultivando a experimentação sonora. Posso afirmar que comecei a ouvir música electrónica ao mesmo tempo que comecei a produzi-la, se bem que na altura não passavam de pequenas brincadeiras, sem nunca pensar que iria gravar um álbum (falo do meu disco de estreia "Phado").
B: Dentro da música electrónica quais foram os projectos que mais te marcaram e porquê?
M: Os projectos de música electrónica que mais me marcaram foram entre muitos, Amon Tobin, Aphex Twin, Squarepusher, Sofa Surfers, Massive Attack, Goldie, LTJ Bukem, Bad Company, u-Zik e Unkle. Marcaram-me essencialmente pela originalidade, pela composição assumidamente electrónica: as batidas quebradas do drum'n'bass, as electrónicas dançantes, os ritmos hip-hop e trip-hop, os baixos do dub e as atmosferas da música ambiental/experimental, foram características e estilos que me cativaram de imediato.
B: Segundo sei manténs um programa de rádio na Rádio Zero, dedicado ao drum’n’bass, é o teu género de eleição? Se sim porquê?
M: Sim, tenho um programa de rádio na Rádio Zero (www. radiozero. pt) do Instituto Superior Técnico (IST) todas as 6f (de 5f p/ 6f), dedicado à música electrónica e drum'n'bass. E sim, o drum'n'bass é o meu género de eleição, se bem que penso estar a passar por uma fase de transição (ou talvez seja apenas uma fase), pois tenho ultimamente apreciado bastante dubstep e techno minimal. Existem muitos projectos interessantes que produzem estes géneros musicais e conseguem criar ambientes, na minha opinião, pouco usuais.
B: Fora do d’n’b o que ouves?
M: Ouço muita música electrónica que me é dada a conhecer, ou através da internet ou por amigos, ou por pesquisa directa em lojas. Projectos muito interessantes, outros que não me cativam muito. Tenho apreciado bastante Broadcast, Monolake, Murcof, Autechre, Burial, Skream, Quantec, entre muitos outros projectos.
B: No teu myspace referes alguns nomes da área da electrónica mais experimental ou IDM, nomeadamente Aphex Twin e squarepusher como influências, é um género que ainda acompanhas? Se sim que nomes destacas no panorama actual?
M: Sinceramente, não tenho acompanhado os dois projectos, nem estou tão pouco actualizado relativamente ao próprio género IDM...Tenho vários álbuns antigos destes dois projectos, mas reconheço que poderia estar mais a par das suas últimas produções e discos.
B: Descreve o teu caminho desde um simples apreciador de música electrónica, até à fase em que começas a manipular sons e a produzir, usando como instrumento um laptop.
M: Como referi anteriormente, comecei a apreciar música electrónica ao mesmo tempo que comecei a produzi-la. Penso que este facto foi bastante decisivo e muito positivo para mim, como experiência contínua e de aprendizagem. Quantos mais projectos ouvia, mais conhecia géneros de música conhecia, e por outro lado, mais e mais ideias me surgiam, naturalmente. Tornava-se quase como que uma necessidade - ouvir para entender o modo como determinada música era construída e ouvir para captar as principais características de cada género de música. Estas ideias eram logo expressas e exploradas no computador. Manipulava e produzia sons usando apenas um laptop, sem mesa de mistura, sem microfones e usando a própria placa de som interna do laptop. Às vezes o mais importante não é o equipamento disponível (sintetizadores, teclados, controladores MIDI, bons monitores, boa placa de som, etc, etc…) mas sim ter as ideias e simplesmente registá-las.
B: Que software usas para a produção e qual o processo que segues na composição de um tema?
M: Uso o Fruity Loops, Wavelab e um arsenal de plug-ins que me ajudam com os efeitos e que constituem verdadeiras ferramentas de edição áudio. 80% das vezes começo pela base - o ritmo e os os baixos - depois adiciono sons - pads, samples, sintetizadores virtuais. A nível de composição e produção não gosto de seguir regras e métodos, a meu ver, limitativos à livre e espontânea criação artística. Claro que existe sempre uma limitação adjacente ao próprio software de produção, ao seu "nº de graus de liberdade", às suas potencialidades, e ainda mais importante que tudo, os conhecimentos do utilizador para usar o software de forma descontraída, rápida e eficaz, como ferramenta de trabalho e produção. Continuando com o meu processo de composição: seguidamente crio uma melodia ou algumas frases na guitarra portuguesa que, na minha perspectiva, encaixam no "background" electrónico. Depois há todo um processo de gravação, selecção das mais bem tocadas frases melódicas e colocação destas no tempo correcto da música. Neste contexto, por vezes a guitarra torna-se mais um som - um ou vários samples de uma melodia, ainda que tocada de propósito para determinado "background" - mas este processo não é regra para que o equílibrio entre as duas sonoridades, da guitarra e da electrónica, funcione bem. Em contraste, 20% das vezes a ideia surge na guitarra portuguesa e a composiçao electrónica desenvolve a partir daí. É curioso que neste caso em que se começa por criar a melodia da guitarra e depois cria-se o "background" electrónico, a probabilidade de existir um maior equílibrio entre as duas sonoridades é maior (se bem que a guitarra tem de ser tocada e gravada ouvindo um metrónomo, caso contrário, é quase impossível criar uma base rítmica que se encaixe). Numa fase mais avançada, faço a sequência com todos os sons por mim criados/alterados/"samplados". E, por último, (pré) masterizo a produção com o Wavelab. Assim nasceu o disco "Phado", por mão própria, em edição de autor, depois de várias recusas de editoras (embora não possa deixar de mencionar os apoios incondicionais da editora sem fins lucrativos Thisco e da Fonoteca Municipal de Lisboa/Câmara Municipal de Lisboa), mas isso é outra história...
B: M-PeX é quase sempre referido como um projecto do músico Marco Miranda. Pergunto: é um dos projectos ou é o projecto? Se é um dos projectos, quais são os outros?
M: M-PeX é o meu projecto a solo, de Marco Miranda. Sou totalmente responsável pelas programações da electrónica e composição, gravação e edição de guitarras portuguesas e guitarras clássicas. Mas tenho outros projectos conjuntos: Double MP (com Marco Ramos, com participações especiais de Tiago Flores (Corvos) e Freddy Locks, em www. myspace. com/doublempband, que prepara o lançamento do disco de estreia “ICTUS” em ínicios de Outubro), McGEA Project (projecto de música electrónica gerada por algoritmos genéticos, com o meu Prof. orientador de tese de mestrado Agostinho Rosa, em www. myspace. com/mcgeaproject, e que já conta com um tema editado digitalmente numa compilação da editora Enough Records) e ainda sou baixista convidado do projecto Hidden ID (www. myspace. com/hiddenidproject), que já conta com EP editado pela Kaos Records/Free Recordings e também prepara o seu álbum de estreia). Também já fui baterista (e vocalista!...) duma banda de metal chamada Silk (com Jorge Rocha na guitarra eléctrica e André Marreiros no baixo eléctrico) e ainda fui baterista numa banda de rock alternativo, chamada "Murmúrio Monótono da Máquina" (com André Coelho no contra-baixo, Pedro Galvão e Miguel Melo nas guitarras eléctricas). Já são alguns projectos…e de vez em quando é complicado conciliar tudo, mas com força de vontade, motivação e muito “amor à camisola” tudo é possível e o tempo é gerido da melhor forma.
B: “Phado” é de facto um disco fantástico! Para mim foi ‘amor à primeira audição’ e o meu exemplar adquirido na FNAC espera ansiosamente por um autógrafo do autor. A ideia de misturar a tradição da guitarra portuguesa com a inovação da electrónica ambiental e experimental é bastante arrojada, como surgiu?
M: É preciso voltar um pouco atrás no tempo para entender todo o processo: o meu avô Luís Tomás Pinheiro, marceneiro de profissão (presentemente reformado) e guitarrista de guitarra portuguesa (ainda dá lições de guitarra!), sempre tocou aos fins-de-semana em casas de fados e festas. Quase todos os fins-de-semana tinha um espectáculo. Por outro lado, alguns dias da semana dava no final do dia lições de guitarra portuguesa em sua casa. No fundo, posso afirmar que cresci a ouvir fado, ouvi diariamente o trinar, o gemer da guitarra portuguesa tocada pelo meu avô. Quando o meu avô se apercebeu do meu gosto pela música, fez-me uma guitarra clássica, moldando ele próprio a madeira. Aprendi os primeiros acordes e comecei a ajudar o meu avô a ensaiar, em casa, antes das suas actuações. O meu avô à guitarra portuguesa e eu a acompanhar à viola (guitarra clássica). Aos 15 anos, o meu avô ofereceu-me a primeira guitarra clássica a sério. Nunca tive aulas de música, à excepção do que aprendi com o meu avô. Penso que o facto de ter crescido a ouvir música, apurou-me um pouco ouvido, pois o que ouvia, conseguia reproduzir. E portanto, foi uma ajuda decisiva para aprender e evoluir sozinho. Um dia, o meu avô desafiou-me para tocar com ele numa casa de fados. Aceitei o desafio e actuámos juntos. Correu bem e continuámos a tocar juntos durante cerca de três anos, até o meu avô "reformar-se" da vida artística. Depois disso, esporadicamente, ligavam-me para tocar com outros guitarristas que não o meu avô. Fui muitas vezes tocar a casas de fados com músicos e fadistas que conhecia na mesma noite do espectáculo (é o chamado “fado vadio”). Num aniversário meu, o meu avô decidiu oferecer-me uma guitarra portuguesa. Fiquei fescinado com o novo instrumento e pedi-lhe logo para começar a ensinar-me alguma da sua escola e métodos. Tratava-se dum instrumento de cordas muito diferente da conhecida guitarra clássica. Dos tempos do "fado vadio", lembro-me bem das críticas que ouvia aos fadistas e dos projectos que tentavam "coisas novas", abordagens diferentes do fado, com instrumentos não tradicionais, e na altura, questionava-me o porquê daquelas críticas. É então que surge a descoberta da música electrónica, como referi anteriormente. Nos dois anos seguintes, explorei a música electrónica. Um dia gravei o meu avô a tocar e brinquei com o que consegui gravar no computador. Achei curioso e gostei do resultado, fui trabalhando o processo, até chegar a este Phado. É assim objectivo de M-PeX reposicionar a guitarra portuguesa no panorama musical, mostrar que não tem de estar só agarrada ao fado, que se pode agarrar a ritmos mais modernos, aconchegando-se, conseguindo respirar e soltar-se, mas sem nunca perder a sua dimensão, em sentido próprio, familiar, íntimo e nobre. É o criar duma ponte entre o ontem e hoje, quebrar barreiras e clichés.
B: Não sendo propriamente um sucesso de massas, nem tendo pretensões a tal, penso eu, o teu disco de estreia quanto M-PeX tem vindo paulatinamente a ganhar a notoriedade e a ter um merecido reconhecimento. Qual a tua visão pessoal do percurso deste disco desde a sua edição até hoje?
M: Para minha surpresa, o meu disco de estreia recebeu e tem recebido um feedback muito positivo, críticas e referências muito gratificantes para mim. Sentir e saber que as pessoas apreciam o meu trabalho e o meu projecto é de facto, a meu ver, o melhor e o mais importante que um músico pode receber. Comecei a produzir umas brincadeiras apenas com um computador, sem qualquer equipamento adicional, numa fase posterior adicionei guitarra portuguesa, os temas começaram a ganhar corpo e maturidade até culminar na edição dum disco, deste "Phado". Com a ajuda da associação cultural sem fins lucrativos Thisco (www. thisco. net) e Fonoteca Municipal de Lisboa/Câmara Municipal de Lisboa, consegui editar este disco em formato CD, em edição de autor (ou seja, o investimento foi suportado por mim, fábrica e custos de pedido de licenciamento na Sociedade Portuguesa de Autores) e através da distribuidora Whitezone consegui que o disco chegasse às lojas FNAC por todo o país. Tenho aprendido muito, tive de estabelecer diversos contactos para que a edição do disco se concretizasse. Contei com a ajuda de muitos amigos a quem agradeço e ficarei eternamente grato: a masterização ficou a cargo de José Reis, o design da capa do disco é de Marco Madruga (www. mozostudio. com) e fotografia de Gonçalo Figueiredo. Fiz uma mini tournée pelas FNAC's do país e foi uma experiência excelente, inesquecível. Do Algarve ao Porto promovi o disco, tratando do booking, rider's técnicos, necessidades a nível de som, horários, etc, etc...Tem sido uma autêntica formação contínua este percurso desde a edição do disco até hoje!
B: O que mudou na tua vida durante este tempo?
M: Muita coisa mudou na minha vida. Para começar, recebo imensos emails por semana, algumas propostas para concertos, encomendas de discos "Phado", alguns emails com feedback positivo, entre muitos outros assuntos, como entrevistas para blogs. Depois é necessário gerir bem a “carreira artística”, actualizar regularmente o site (no meu caso MySpace), responder aos imensos emails que recebo no MySpace, aceitar os convites de amizade que recebo de outros projectos de música, alguns nacionais outros não. Depois é necessário promover e divulgar eventos, críticas, entrevistas e novidades acerca de M-PeX em geral, duma forma regular junto da lista de contactos (que também está continuamente a ser actualizada) através duma newsletter. Por outro lado, os concertos têm sido bastantes, mais do que eu poderia estar à espera. É muito bom tocar ao vivo e mostrar o nosso trabalho ao público. Hoje em dia tenho de gerir muito bem o meu tempo, estabelecer prioridades. Caso contrário, seria impossivel trabalhar, estudar (estou a acabar a minha tese de mestrado em Engª Física, no IST), gerir uma “carreira artística” (não gosto muito deste nome!...) e ainda ter tempo para a família e amigos.
B: Que planos para o futuro? Já tens alguma coisa pensada para suceder a este “Phado” ou ainda estás em fase de o deixar respirar para te inspirares?
M: As minhas produções prosseguem e neste momento, se quisesse, já podia editar outro disco, pois já tenho temas suficientes (alguns poderiam estar incluídos no disco “Phado”, mas ficaram excluídos por minha escolha própria). Mas prefiro que "Phado" respire um pouco mais...acho que ainda é cedo para avançar com novo disco. Mas posso avançar em primeira mão que no próximo disco vão existir temas ambiente, passando pelo dubstep, electro, techno minimal e drum'n'bass, com guitarra portuguesa. Vai ser bastante diversificado. E talvez exista um tema ou outro cantado...a ver vamos. Por outro lado, tenho alguns temas de drum'n'bass (mas sem guitarra portuguesa...) que talvez breve edite em formato digital, a ver vamos também...De qualquer forma, poderão sempre visitar-me em www. myspace. com/mpex e saber as novidades de M-PeX, e quem quiser receber a minha newsletter por e-mail, basta enviar-me e-mail para mpex.phado@gmail.com a solicitá-la.
B: Hoje à noite vais estar a tocar em Coimbra, ao ar livre num local cheio de história e memória onde outras guitarras portuguesas já fizeram muitas serenatas e cantaram muitas estórias. O que esperas desta actuação?
M: Espero que seja uma noite mágica, memorável e que o evento seja um sucesso, com muita afluência de público, e que este seja agradado pelas sonoridades de M-PeX e de restantes bandas/projectos. Espero poder proporcionar um bom espectáculo, num evento com muita animação, boa disposição e vibrações positivas. E mais uma vez obrigado pelo convite e oportunidade em participar no evento "Make Up Your Mind 2008", e por esta entrevista simpática! Obrigado!
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